segunda-feira, 5 de março de 2012

"CABO DE GUERRA ENTRE URBANISTAS" - Minhas Considerações





Prezados Editor Chefe e Jornalista


Lendo hoje (domingo 04 de março de 2012) a matéria do Jornal A Notícia com o título “Cabo de Guerra entre Urbanistas”, confesso que, a princípio me diverti, pois não consegui chegar a conclusão alguma – afinal, qual foi o objetivo desta matéria?


Se a intenção era  informar a sociedade sobre um tema tão relevante para o futuro da cidade, que é o seu planejamento, creio que o resultado foi desastroso. Não afirmo imbuído de qualquer ressentimento, mas penso que manipular a informação requer muita responsabilidade. Eis que exalto o seguinte juramento:  “Juro exercer a função de jornalista  assumindo o compromisso com a verdade e a informação. Atuarei dentro dos princípios universais de justiça e democracia, garantindo principalmente  o direito do cidadão à informação. Buscarei o aprimoramento das relações humanas e sociais, através da crítica e análise da sociedade,  visando um futuro mais digno e mais justo para todos os cidadãos brasileiros. Assim eu Juro.”


Então, nesta salada geral que foi a matéria, vou apresentar algumas considerações, já que não me foi dada esta oportunidade antes de citarem meu nome.


Diante da leitura do juramento acima, me veio a mente a hipótese de que a intenção inicial do jornalista deve ter sido pautada na tentativa de mostrar as diversas visões da sociedade sobre um tema muito importante. No entanto, ao ler a reportagem com mais atenção e diante de tantas manifestações, ao longo do dia, penso que, se a intensão existia, ela “se perdeu” no excesso da fofoca e pela falta completa de profundidade e conhecimento no assunto. Também penso que seria ético tomar das pessoas citadas (todas) algumas opiniões, visto que não me recordo de qualquer contato.


Incomodou-me um pouco a descrição dos currículos na medida em que, para alguns exalta informações e detalhes, para outros omite e até as distorce. Na descrições do meu currículo, por exemplo, omite informações importantes, não porque eu seja levado por um super-ego, mas pelo simples critério de isonomia que a matéria deveria tomar.

Também penso que resumir minha atividade rpofissional a “consultorias com alguns municípios do Norte do Estado” deixa a de diminuir o meu trabalho, pois reputo aos meus clientes e aos serviços prestados por minha empresa, que completa 22 anos de existência, grande valor e, os meus limites estão muito além do território citado.


Eis um pouco do que o jornalista deveria saber.


Venho exercendo minha cidadania há muitos anos. Há mais de 37 anos comecei a entender o que isto significava.


Quando cheguei ao Rio de Janeiro, participei ativamente contra a ditadura, lutando por um país com liberdade, democracia e pelo pleno Estado de Direito - Estado de Direito significa que nenhum indivíduo, presidente ou cidadão comum, está acima da lei. Os governos democráticos exercem a autoridade por meio da lei e estão eles próprios sujeitos aos constrangimentos impostos pela lei. As leis devem expressar a vontade do povo, não os caprichos de reis, ditadores, militares, líderes religiosos ou partidos políticos auto-nomeados.


A liberdade de imprensa de hoje deve-se a alguns brasileiros que não se acovardaram, que não se omitiram, que tiveram a coragem de emitir opiniões e enfrentar um governo opressor, sair as ruas, manifestar seu repúdio mesmo que isto pudesse lhes custasse a liberdade. Um momento da história a qual seria ridícula chama-la  como um “cabo de guerra” entre a sociedade e governo. Este foi um dos pilares da minha formação cidadã.


As lutas por um país verdadeiramente democrático ainda estão longe de estarem concluídas. Penso mesmo que elas nunca se encerram, pois ao menor descuido da sociedade, a corrupção, os desmandos e o cerceamento do Estado de Direito floresce, e vocês como jornalistas, sabem bem do que estou falando.


Então, a leitura do jornalista sobre as minhas lutas em defesa da democracia, mais recentemente da democracia participativa, esta incorreta, pois elas não iniciaram há três anos nem estão unicamente vinculadas ao Plano Diretor, muito menos ao IPPUJ, que é uma instituição. Mas governos e instituições abrigam pessoas e, pelas abrigam pensamentos diversos, por vezes contrários, algo absolutamente natural numa sociedade democrática.

Perco a conta dos movimentos aos quais me engajei, contra ou à favor.  No entanto, o que serve a imprensa é somente o contraditório, pois é ele que chama a atenção.

Então, abstecendo esta linha, fui contrario o aumento de vereadores, contra o aluguel de carros na Câmara de Vereadores de Joinville, participei ativamente da proposta encabeçada pelp Jornal A Notícia sobre os parques de Joinville e, assim por diante. Temas na qual a sociedade, da qual faço parte, se engajou.  Para estas situações não houveram citações na matéria.


No âmbito do Planejamento Urbanos existem origens muito fortes.


Participei, como tantos outros arquitetos e urbanistas pelo Barsil afora, de inúmeros seminários, congressos e debates para a construção do Estatuto da Cidade, um longo caminho que durou 10 anos, até transformar-se em Lei, (Lei Federal 10.257/2001).


Por desejar este marco legal como um novo horizonte para as cidades brasileiras, fui me instruindo para entender todos os enunciados e, colocá-los em prática. Então cito a alguns pontos desta lei: Na minha concepção, são três os grandes avanços:
1) o exercício obrigatório da democracia participativa, onde a constituição do Conselho da Cidade é apenas uma parte deste processo que se inicia com consultas públicas e se encerra com as audiências públicas;
2) a função social da propriedade, como pressuposto a qualquer política urbana de desenvolvimento em favor dos excluídos, uma quebra de paradigma na qual as oligarquias e o poder econômico resistem em compreender e aceitar,
3) os instrumentos para a politica urbana, que oferecem meios para colocar em prática as diretrizes da política de desenvolvimento urbano. 


Pode parecer estranho aos jornalistas os conceitos e enunciados acima, mas eles são parte do cotidiano (como é o Código Civil para os advogados), para o meu trabalho que reforça as minhas convicções. isto está há anos luz de qualquer viés ou caráter pessoal, rancor ou interesse de negócios, como a matéria faz crer.


Para definir um arcabouço legal que nos permita traçar um desenvolvimento urbano sadio, democrático, que privilegie a inclusão social, que nos torne competitivos e com inteligência, devemos aprofundar as discussões na sociedade e, com a sociedade, pois esta cidade sempre foi de poucos.

Este é um dos motivos pelo qual me engajo nos debates, ou sou visceralmente contrário a falta do exercício da democracia participativa. Foi minha a frase, decorrente de um texto, a qual se tornou localmente conhecida: “Goela Abaixo”


Não se trata apenas de ser contrário à verticalização, á implantação de eixos e faixas viárias ou à expansão do território urbano sobre a área rural. Trata-se de algo mais sério e profundo por não ser possível identificar estratégias nem as consequências destas propostas muito distantes daquelas eleitas no Plano Diretor, que foram amplamente discutidas e debatidas para evitar  repetir os erros do passado, onde a cidade expandiu para além dos limites possíveis, a um custo social gigantesco. Não podemos jogar esta memória no lixo para recomeçar do mesmo jeito.


Levamos 33 anos para ter um novo Plano Diretor. Em 2006 já deveríamos estar debatendo as leis acessórias e, o Conselho da Cidade já deveria ter sido instalado. Por 5 anos este Plano foi sendo retardado no executivo. Enfiaram no meio desta história uma consolidação das leis urbanísticas, inapropriada e totalmente clientelista. Ao invés de perder tempo, deveríamos estar debatendo os Planos e leis acessórias ao Plano Diretor. Foram dois anos de retrocesso. Pior é que o discurso da época é o mesmo de hoje: "não podemos comprometer o desenvolvimento de Joinville". Ora, só fazem dosi anos que a consolidação foi aprovada e já estamos comprometidos?


Querer empurrar para 3, 4 ou 5 pessoas a responsabilidade por não haver uma nova Lei de Ordenamento me parece total carência de verdade e bom senso. Me parece uma atitude leviana, pois ela não  avalia a responsabilidade dos agentes públicos sobre um elenco de omissões que ainda permanecem.


Passados 5 anos da aprovação do Plano Diretor não dispomos de nenhum plano estratégico, da Mobilidade Urbana  por exemplo, que tanto aparece nas páginas do jornal. Passados 5 anos não houve qualquer articulação entre os diversos conselhos municipais constituídos para alinhar as políticas públicas. Passados 5 anos, não tivemos uma audiência pública sequer protagonizada pela Administração Pública Municipal para discutir as políticas urbanas, nem mesmo para as diversas emendas às leis urbanísticas que vieram para atender shoppings centers, universidades, lojas de materiais de construção e toda sorte de “negócios imperdíveis” para a cidade. 


Então pergunto: Para quem são feitas as leis?

Faço uma sugestão: viagem 120 km e vejam se este tipo de atituide é cabíbel em Curitiba, que serve de exemplo para tanta coisa em matéria de planejamento urbano no mundo.


Mas tudo que tem haver com o urbanismo, quando não há mais argumento razoável, passa a ser relacionado à KGB que  “conspira contra o desenvolvimento de Joinville”!

Leiam as propostas formuladas ao longo dos debates do Plano Diretor, nas audiências na Câmara de Vereadores, nos textos postados em blogs e no jornal, a começar pela necessidade de protagonizar audiências públicas, amplas, para todos, devidamente instruídas, preparadas e divulgadas.

O Plano Diretor  não pode ser um nicho no qual apenas os “urbanistas” façam o debate. Este processo,. se passa pelo ridículo, é por responsabilidade do Poder Público, e não dos cidadaõs que de forma legítima defendem ideias e rotinas.  Há que se interromper isto, pois sua continuidade apenas ajuda ao status quo, que não deseja debate algum.


Então, desfaio a fazer um trabalho verdadeiramente jornalístico, aprofundando esta matéria. Vamos abrir o livro?


São tantos os tema, mas posso indicar alguns: A quem interessa as terras da Estrada da Ilha, do Oeste e Paranaguamirim? Quem são os donos que tomaram posse há pouco tempo? Quanto custará aos joinvillenses estas aventuras?  Alguém responde?


Sugiro ao jornalista perguntar: Como uma proposta para área de transição propõe originalmente parcelamentos em lotes de 2.500 m2, e  ao passar para 600 m2 não há qualquer argumentação contrária? Como esta decisão  pode contribuir para do desenvolvimento da cidade? Segundo consta estas áreas seriam destinadas para condomínios de luxo como faz crer oumvereador.

É isto mesmo que necessitamos para resolver nossos problemas urbanos? Quais serão as consequências das propostas dos eixos e faixas viárias para a mobilidade e para a tranquilidade dos moradores? A quem interessa expandir a área urbana de Joinville sobre terras rurais e de risco ambiental?  Porque o mapeamento das áreas de risco não aparecem nas ARTs, se estas áreas estão impedidas de ocupação por decisão do Ministério Público Federal? Como podemos desrespeitar o Plano Diretor que estabelece que o perímetro urbano não pode ser ampliado?


Obter algumas destas respostas pode explicar como é difícil dialogar com o Poder Executivo e com alguns vereadores no Legislativo. Como dialogar com quem se faz de surdo? Já participei de audiências na Câmara onde a plenária manifestou-se 100% contrária a um projeto de lei e, momentos após, os vereadores aprovam a proposta. Que democracia é esta?


Fica também uma inquietante indagação: Porque na matéria não houve uma consulta a algum vereador que pensa diferente do vereador Lauro, como por exemplo a vereadora Tania, que  fez um alerta e um contundente manifesto ao processo de elaboração da LOT, assemelhando-se em muito à opinião daqueles que são taxados como “uma pequena elite ideológica de inconformados”.


Lembrem-se caros jornalistas, aqueles que estão no poder dispõe de tempo, mídia a seu favor e proventos pagos pelos cofres públicos. Para que eu possa defender meus ideais e exercer a cidadania, preciso exerce-la de forma voluntária, afinal não tenho relação com qualquer partido político, não sou pretendente a cargo público e, acima de tudo, aprendi a não calar e sucumbir na omissão.


Quando nos rotulam de KGB, foi com um único propósito – ridicularizar. Não somos 3, nem 4 e nem 5. Somos muitos. Para o bem da verdade, esta história de KGB ocorreu antes deste governo assumir. Portanto, o viés ideológico sempre argumentado na contestação de alguns dirigentes da administração municipal é apenas uma falácia sem qualquer fundamento.


Minha defesa por um Plano Diretor democrático iniciou-se em 2005, quando assumi o Núcleo do Instituto de Arquitetos do Brasil da Região de Joinville e ali, juntamente com o  Arno Kumhlen, Marcos Bustamente, Julio de Abreu, Eneida Arraes, Frederico Schlipper, Rosana Martins e Fárida Mira estruturamos uma serie de debates que deram forma ao Plano Diretor atual, cujos parceiros foram o CEAJ, UDESC, UNIVILLE e o Instituto Joinville). A propósito, este Plano Diretor tem uma digital muito forte do saudoso empresário e amigo Ivo Gramkow.


Tentar vincular este processo como unicamente direcionado ao Governo atual, como se fossemos visceralmente inimigos, é absolutamente falso, pois passa a  diminuir todo o tempo e trabalho empreendido, por mim, por amigos, por profissionais e por centenas de joinvillenses que voluntariamente debateram o Plano Diretor. Por outro lado, comprendo a defesa dos interantes do Governo nas suas atitudes e decisões, mas é meu direito não concordar com elas.


A matéria poderia ter maior importância para o debate da cidade se, para ambos os lados, fosse disponibilizada a oportunidade de falar e opinar sobre os temas e, menos sobre as pessoas. Catar um ou outro post na rede social é muito pouco para um assunto de tamanha envergadura e, da forma como foi pautado, me parece mais apropriado a um jornal de fofocas.


Como somos mortais e erramos, acho que neste caso o erro está caracterizado e, o Jornal A Notícia, que é um grande veículo de comunicação, certamente não deixará de protagonizar outras oportunidades para que pessoas de bem possam contribuir na conquista de uma sociedade justa e democrática.


A verdadeira democracia, uma democracia real, no direito e na apropriação, com igualdade de possibilidades em respeito ao acesso dos bens (materiais e imateriais) mínimos para uma vida digna, com a erradicação da pobreza e da violência urbana, no melhoramento da gestão ambiental, na repartição da riqueza e distribuição das responsabilidades só é possível por meio da participação cidadã na governabilidade local e da mobilização e iniciativa de indivíduos, comunidades, associações e organizações públicas e privadas em prol do bem comum.” - Prof. Ruben Rockenbach


É nisto que acredito, o resto todo é uma imensa bobagem ou uma grande armação.


Sérgio Gollnick

Arquiteto e Urbanista


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